segunda-feira, 12 de maio de 2008
Vista chinesa - 02
A China que eu vejo da janela
Quando comecei a tirar as fotos deste post, tinha a idéia de mostrar a Pequim onde eu vivo, quase como uma redação infantil sobre a viagem a um lugar distante. Mas na medida em que fui fazendo as imagens, percebi que via das minhas janelas uma crônica da espetacular transformação na qual a China está mergulhada e dos problemas que a acompanham.
Eu moro no mesmo condomínio onde vivi entre março de 2004 e março de 2005, na minha primeira passagem pela China. Nos três anos que se passaram desde então, a paisagem a meu redor mudou de maneira radical. Quando cheguei em 2004, meu condomínio ainda estava em construção e me instalei em um dos poucos prédios já prontos. A rua que vocês verão nas fotos abaixo tinha apenas uma mão em cada direção e o movimento de carros não era nem uma sombra do atual. Em frente a meu condomínio se iniciava um mega-complexo imobiliário, com sete edifícios residenciais, três torres comerciais e um shopping de luxo. No ano em que fiquei aqui, vi os sete prédios residenciais ficarem quase prontos. Agora, o shopping e as torres estão funcionando a todo o vapor.
O condomínio que estava em construção atrás do meu também foi concluído e surgiram duas outras torres comerciais a algumas quadras. A pequena rua que dividia meu condomínio em duas partes se transformou em uma longa e larga avenida, que se espalha por várias quadras. O prédio que existia quase na perpendicular do meu condomínio foi demolido e deu lugar a uma das centenas de construções de Pequim.
A cidade que era o reino das duas rodas hoje tem mais carros que bicicletas _3,3 milhões contra 2,4 milhões. A cada dia, 1.000 novos veículos se agregam à frota de Pequim. O resultado são congestionamentos crescentes e uma contribuição considerável à já preocupante poluição. Há dias lindos de céu azul em Pequim e eles são cada vez mais numerosos. Mas existem dias como hoje, em que a névoa e a poeira impedem uma visão nítida de tudo que esteja distante.
Minha janela também me faz lembrar que Pequim vai sediar os Jogos Olímpicos daqui a 115 dias. No enorme telão digital que cobre quase toda a fachada do shopping, vejo todos os dias a contagem regressiva para o dia 8 de agosto de 2008, quando a Olimpíada começará.
Aí vão as fotos (peço perdão novamente pelas que estão na horizontal, mas com a diferença de fuso horário, não tive tempo para resolver o problema técnico com o pessoal de São Paulo):
Havia outro prédio no lugar do que está em construção na primeira vez em que morei aqui.
( NR) China em alta velocidade
Derrotado e destruído na Segunda Guerra Mundial, o Japão foi protagonista de uma ascensão meteórica dos anos 60 a 80, em uma trajetória semelhante à que a China percorre hoje, com altíssimas taxas de investimento e crescimento acelerado. O PIB japonês teve expansão média de 10% na década de 60, 5% na de 70 e 4% nos anos 80. Mesmo com a forte desaceleração registrada a partir da década de 90, o Japão mantém o posto de segunda maior economia do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, com uma renda per capita de US$ 34,3 mil, comparada a US$ 6,9 mil no Brasil.
A China cresce a uma média de 10,6% ao ano há três décadas e logo vai superar o Japão no ranking das potências econômicas. O país comunista se parece com o seu vizinho de 40 anos atrás em outro aspecto: a decisão de investir em um sistema de trens de alta velocidade, algo que se discute no Brasil há anos e nunca sai do papel.
No ano passado, a China aumentou para 200 km/h a velocidade dos trens em 6.000 km de linhas pré-existentes, com utilização de tecnologia canadense, japonesa, francesa ou alemã. Mas seu projeto mais ambicioso nessa área é a ferrovia que vai ligar as duas maiores cidades do país, Pequim e Xangai. A linha de 1.318 km começou a ser construída no dia 18 de abril e consumirá investimento de US$ 31,6 bilhões, o maior já realizado em uma obra de infra-estrutura desde a Revolução Comunista de 1949. O mais importante: o trem é totalmente construído na China, com tecnologia própria. A previsão do governo é que a obra esteja concluída em 2013, quando será possível viajar de Pequim a Xangai em cinco horas.
No Japão, o chamado shinkansen liga o país de um extremo a outro. A distância entre as partidas é contada em minutos e é possível comprar as passagens quase na hora do embarque. Os trens andam a uma velocidade de 250 km/h a 300 km/h e os atrasos são praticamente inexistentes. Em 40 anos de operação, nunca houve um acidente importante com o shinkansen.
Quando eu viajava no sábado de Kyoto para Tóquio a 300 km/h tive um choque de realidade e fui lembrada do quanto ainda estamos distante deste mundo que eliminou a pobreza e pode se dar ao luxo de ter privadas aquecidas. A seção internacional do Japan Times trazia uma enorme foto em preto e branco de uma favela de Recife, na qual um grupo de moradores aparecia ao redor do corpo de um homem morto a tiros. Na legenda, a informação de que a violência no Brasil não se restringe aos grandes centros urbanos do Sudeste e atinge índices alarmantes na capital pernambucana.
O presidente francês visitou a China em novembro do ano passado e conseguiu fechar contratos no valor de US$ 30 bilhões para venda de aviões e reatores nucleares para o governo de Pequim. Só a Airbus, que tem sede na França, assinou contratos para entrega de 160 aeronaves, no valor de US$ 17,4 bilhões. A estatal francesa Areva vendeu reatores nucleares avaliados em US$ 11,9 bilhões.
Com os setores aéreo e de infra-estrutura totalmente controlados pelo Estado, a China tem o poder de definir de quais países suas empresas vão comprar equipamentos de preços bilionários. E também pode romper contratos já assinados, desde que isso atenda a seus interesses políticos.
O país asiático vai subir neste ano para o terceiro lugar no ranking das grandes economias do mundo, acima da Alemanha e atrás apenas de Estados Unidos e Japão.
Ansiosos por abocanhar um pedaço desse mercado, empresas e investidores fazem concessões que dificilmente aceitariam em países menos relevantes do ponto de vista econômico. Google e Yahoo! se adaptaram às regras da censura chinesa e incluíram em seus dispositivos de busca mecanismos que bloqueiam as páginas vetadas pelo governo chinês. O Yahoo! foi mais longe e forneceu a Pequim informações que permitiram a identificação de um internauta que havia enviado um e-mail para um amigo em Nova York com cópia de um documento do Partido Comunista. Graças à ajuda do Yahoo!, o internauta chinês foi condenado a 10 anos de prisão.
por Cláudia Trevisan, correspondente do Estadão em Pequim
http://blog.estadao.com.br/blog/claudia/
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