quinta-feira, 19 de junho de 2008

Atividades econômicas têm cérebro no exterior

por Ricardo Balsani Ferraz, nº USP 5133540

No Brasil, as atividades econômicas são dirigidas por empresas que possuem seu centro de decisão nas grandes potências do capitalismo, de modo que aqui o jornalismo econômico não tem a mesma função que exerce em outros países. Com o “cérebro no estrangeiro”, ele pratica tão somente um minimalismo informacional, destinado a fazer ressonar as idéias de uma elite para ela mesma. Essa é a opinião de Bernardo Kucinski, jornalista e cientista político, que retornou à USP, onde lecionou, para ministrar palestra aos alunos do curso de jornalismo. Ele traçou um panorama do jornalismo econômico no país, e ensinou estratégias de sobrevivência em um ambiente que define como cada vez mais autoritário nas redações brasileiras.

Para Kucinski, hoje o Brasil é terreno de engorda para o capital internacional. “Ele chega pequeno, cresce, e vai embora.” Com uma economia dependente, o capital financeiro exerce domínio sobre o capital econômico, o que acaba tendo implicações também para o jornalismo. Isto poderia ser observado, por exemplo, na questão da volta da inflação. Segundo ele, uma importante discussão sobre qual seria o tipo da inflação que está nos atingindo, de custo ou de demanda, está sendo negligenciada pela imprensa. Assim, preserva-se o interesse do capital financeiro, personificado pelos bancos, interessado em aproveitar a situação para retomar a trajetória de crescimento dos juros, inflando seus lucros. Juros altos poderiam solucionar uma inflação de demanda, mas não resolveriam o problema de uma inflação de custo, como a que estamos vivendo.

Segundo Kucinski, esse caso demonstra que as discussões econômicas no Brasil são dominadas pelo interesse de uma elite, que mantém uma relação promíscua com o jornalismo. Ele cita as próprias manchetes de jornais para exemplificar como o grosso da população está sendo excluída do jornalismo econômico, que acaba falando ao próprio umbigo, pautado e direcionado às elites. O jornalista que inicia sua carreira em redações como essas acaba adquirindo vários vícios, como por exemplo a autocensura. Este, aliás, é apontado por Kucinski como um dos mais graves defeitos do jornalista brasileiro. Ao contrário de seus colegas estrangeiros, ele retira de seu texto as informações mais picantes ou polêmicas, o que resulta em uma ficção sobre o real, e não jornalismo.

Como alternativa ao jornalista iniciante, Kucinski destaca um florescimento editorial, com o surgimento de novos veículos, e o revigoramento da imprensa alternativa. São esses ambientes que ele aponta como desejáveis para que um jornalista passe os primeiros anos de sua carreira, pois assim ele será menos utilizado na luta ideológica. Para ele, ser muito bom é uma das soluções para que o jornalista sobreviva no nosso mercado, e para isso ele deve aproveitar as chances que a profissão dá e mergulhar nos assuntos que trabalhar. Assim, além de se desenvolver, ele evita o que Kucinski chamou de jornalismo tangencial, que apenas fica na superfície dos temas. Para ele, o jornalista também deve se maravilhar e indignar com o que vê, evitando uma postura cética ou cínica. O jornalista que não exercita a capacidade de se comover acaba ficando fraco.

Baseado em suas próprias experiências, Kucinski aconselhou os estudantes a investirem nas relações pessoais com seus colegas de profissão. Seria importante pertencer as “panelinhas”, grupos de jornalistas reunidos por uma afinidade natural, ou um projeto em comum. Ao invés de excluir as pessoas de for, sua função seria a de oferecer suporte mútuo aos membros dos grupos, quando as horas não forem as melhores. Além disso, ele recomenda que os jornalistas tenham um tato especial na hora de fazer críticas a um colega, evitando, se possível, citá-lo nominalmente. Ele argumenta que elas sempre pesam para quem as recebe, e isso pode ser virar contra a pessoa que apontou os erros.

Kucinski também defendeu a ética defensiva como estratégia de sobrevivência. Ser correto com as fontes, e posteriormente com os leitores, fará com que a sociedade respeite mais o jornalismo. Para os casos em que acontecem abusos, ele defende uma legislação específica para a imprensa, pois se os jornalistas têm alguns direitos especiais, também devem ter maior responsabilidade. Para ele, muitas vezes a imprensa falta com o respeito por algumas pessoas, que são expostas, caluniadas e difamadas.

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